São temas que, espontaneamente, surgem entre os integrantes e colaboradores do IDD que são provocados a pesquisar, produzir e finalmente gerar um conteúdo diferenciado.

Arquitetura na Amazônia ontem e hoje

Arquitetura na Amazônia ontem e hoje

A princípio, em 1976, a Biblioteca Nacional, sob a direção de Jannice de Mello Monte-Mór, entregava ao público o texto integral do tratado do P. João Daniel, o Tesouro Descoberto no Rio Amazonas.

A Biblioteca Nacional organizou o então Ciclo de Estudos Amazônicos. Como ponto de partida para uma reflexão mais profunda sobre os problemas e o fascínio da Amazônia.

Uma das conferências foi com o então arquiteto Severiano Mário Porto. O trabalho então intitulado “Arquitetura na Amazônia ontem e hoje”, que aqui reproduzimos na íntegra.

Arquitetura de ontem e de hoje no Amazonas. Arquitetura de ontem e de hoje em Manaus.

Sim, podemos vincular ou exemplificar a quase totalidade das construções de Manaus, sendo que ela continua a ser a maior cidade da Amazônia Ocidental.

Situada, às margens do então rio Negro e no ponto de encontro deste com o rio Solimões, dando origem a partir daí ao rio Amazonas. Manaus torna-se ponto natural de convergência, de irradiação e apoio para todas as regiões abrangidas por esta grande bacia hidrográfica com seus quilômetros de extensão.

E neste ponto forçosamente teria de existir uma cidade. Teriam de existir tribos de índios (Barés, Banibás e Passés). Este ponto seria escolhido mais tarde para a então sede do Forte de São José do Rio Negro em 1669 por Francisco da Mota Falcão.

E Manaus foi vivendo e crescendo lentamente até que nos fins do século passado teve o seu primeiro grande pico de desenvolvimento na famosa “época da borracha”.

Esta é a fase que normalmente responde pela arquitetura de ontem.

Nela encontramos as grandes diretrizes básicas do seu urbanismo, graças à presença e visão do então governador Eduardo Ribeiro. Ele que traçou diretrizes e dotou a cidade de uma infraestrutura que respondeu pelo seu crescimento até os dias de hoje, quando estamos vivendo a fase do segundo grande pique de desenvolvimento do Amazonas.

O então Porto de Manaus, construído naquela época, responde por toda a movimentação de carga e descarga, apesar do imenso crescimento de suas atividades e de continuar sendo praticamente o único acesso de chegada e saída de mercadorias. O seu sistema é perfeito, adaptado ao regime das cheias e vazantes com suas oscilações de mais de 10 metros, além da correnteza do rio Negro.

O sistema de abastecimento de água, também desse período, atendeu até cerca de 4 anos atrás toda a cidade. O sistema de esgotos iniciado e construído em algumas ruas e avenidas centrais até hoje ainda é levado em consideração, quando se projetam as novas redes de esgotos.

Diante deste quadro podemos concentrar nesta fase os exemplos da arquitetura do passado. Todos sabemos que foi uma das fases mais prósperas do Amazonas.

As viagens de negócios, de turismo, de estudos eram assim feitas para os centros mais desenvolvidos no sul do país e na Europa. Os filhos das famílias mais favorecidas iam estudar nesses grandes centros.

A moda e os padrões eram importados, e na arquitetura podemos sentir o reflexo destes fatores. Importamos projetos. Importamos edificações inteiras, pedra por pedra e as montamos em Manaus.

E podemos vê-las nas fotos destes períodos e em edificações que ainda permanecem como testemunho da época.

Teatro Amazonas, Palácio da Justiça, Prefeitura Municipal de Manaus, Alfândega, Casa dos Azulejos da firma J. S. Amorim, Faculdade de Direito, a Matriz, a antiga Caixa D’Água, as várias pontes metálicas, o Porto de Manaus, e muitas outras.

São lembranças do passado. Testemunhos de uma época em que o conhecimento da ecologia não se tornava desesperadamente necessário como nos dias atuais, em face da explosão demográfica, do crescimento urbano e de todos os problemas deles decorrentes.

São lembranças de um passado romântico a que somos transportados quando nos deparamos com suas construções ou fotos de sua época.

Do ponto de vista técnico as construções importadas de regiões de condições bastante distintas da Amazônia, apesar de pequenas adaptações, não correspondiam em toda a sua plenitude às necessidades do nosso clima.

Elas eram favorecidas pelos seus pés-direitos altos, piso e forro de madeira em sua grande maioria. Pelas grossas paredes de alvenaria, que de acordo com a técnica construtiva da época, eram feitas de pedra e tijolo e como aglomerante usavam óleo de baleia e cal, e geralmente com as paredes internas de taipa, e este conjunto de elementos criava condições favoráveis em seu interior; entretanto havia despreocupação com a proteção externa das fachadas, com a colocação de beirais protetores de suas paredes e empenas, e uso de elementos que permitissem renovação permanente de ar em seu interior, etc.

Mas também seria pedir demais, pois até hoje não só na Amazônia, mas em quase todos os recantos do Brasil continuamos a não nos preocupar com estes fatos, isto é, da adaptação da edificação às condições regionais e específicas de cada cidade.

E assim abordamos em rápidas pinceladas o tema relativo à arquitetura do passado e devíamos começar a falar sobre a arquitetura de hoje, e dessa maneira cometermos o erro de sempre, isto é, ignorarmos a arquitetura espontânea do homem local. Esta sim, a mais rica em subsídios relativos à ecologia, identificação e emprego de materiais regionais, sistema construtivo, escolha do sítio e implantação da edificação.

Este ponto devia ser o de partida.

Nele vamos encontrar várias vezes a tão sonhada e pesquisada casa do Amazonas ou da Amazônia.

Na sua simplicidade e de forma espontânea eleva o piso da construção, constrói os panos verticais de vedação (as paredes) de palha ou de madeira, sem atingir a cobertura, e esta também recoberta de palha.

O piso elevado a protege da umidade e defende de animais, as paredes de palha funcionam como elemento de vedação, isolamento térmico, permitindo também aeração, o vazio existente entre as paredes e a cobertura deixa o ar circular livremente, que dessa maneira elimina o resto de calor transmitido por esta.

Estes são os princípios básicos. Simples e evidentes.

A tecnologia aplicada é variada, ora usam paus roliços e ora madeira lavrada em sua estrutura: nas paredes tábua ou palha, no piso tábuas ou troncos roliços de palmeiras e na cobertura palha. São usados vários tipos de palha e cada um possui o seu sistema próprio de colocação.

Outro tipo de habitação é o da casa flutuante, um dos exemplos mais ricos de ecologia e criatividade.

Sobre imensas árvores de madeira tipo balsa eles constroem seus pisos flutuantes e sobre os mesmos fazem uma casa convencional que 6 equipada até com uma pequena caixa com terra para cultivar o seu pé de pimenta o cheiro verde.

E ela acompanha o subir e descer das águas, e rebocada se desloca quando necessário.

Todas estas casas são de uma simplicidade muito grande tendo uma ocupação integral de seus cômodos ou de seu cômodo dia e noite. De dia funcionam como sala e nele se desenvolve a vida da casa e à noite armam-se as redes de dormir e passam a funcionar como quartos.

Como se pode ver, estas construções simples e espontâneas apresentam uma série de soluções, frutos de uma vivência de anos e talvez séculos e não podem ser desprezadas.

E a arquitetura de hoje?

Sim, Manaus teve a sua segunda oportunidade.

Teve o seu segundo impulso.

O primeiro foi espontâneo, causado por sua riqueza nativa, a borracha.

O segundo, fruto da intenção do Governo Federal de desenvolver e integrar a região Amazônica ao restante do país.

Aconteceu em 1967, mais precisamente em 28 de fevereiro, com a então criação da SUFRAMA e da Zona Franca de Manaus.

Convidados pelo Governador do Estado do Amazonas, o Professor Artur César Ferreira Reis, em janeiro de 1965, para fazemos alguns projetos no Amazonas, tivemos a oportunidade de viver e sentir a vida de antes e suas modificações intensas e sucessivas ocorridas nestes quase 10 anos de SUFRAMA.

Na fase inicial foi fácil para nós o contato humano, ver e sentir as regiões, as habitações, as soluções empregadas, etc., e aí começamos o nosso aprendizado, a nossa pós-graduação, que continua até hoje.

Apaixonado pela madeira, como todo arquiteto, fomos adaptando o nosso detalhamento às condições locais, às ferramentas usadas e ao tipo de mão-de-obra regional.

Começamos a usá-la em coberturas, forros de madeira, beirais longos, e algumas outras tentativas em escolas e residências. Mas era muito cedo. Casa de madeira era usada só por “gente pobre”, escolas de madeira, embora com portas e peitoris revestidos de fórmica, podiam ser confundidas com barracos e eram rejeitadas.

Começamos então com a nossa casa, que fizemos de madeira, bem simples, bem barata, e para nossa família, “bem simpática”.

Situada numa pequena encosta possuía uma varanda na parte inferior, situando-se na parte superior a cozinha, a sala e os quartos. Praticamente todos os painéis de vedação eram de venezianas largas de madeira reguláveis e todas feitas no próprio local da obra. Os quartos também dentro do mesmo sistema eram estreitos e se comunicavam com uma varanda situada na frente da casa.

Houve também preocupação em se prever a ventilação cruzada. A cozinha e os banheiros foram construídos em alvenaria.

Aí moramos 6 anos e meio, assim naquele tempo fora da cidade e perto de um igarapé (pequeno riacho) com um banho (piscina rústica de água corrente).

E começamos a ser visitados. A ideia começava a ser aceita. Nos projetos do Governo usávamos generosos beirais, e entusiasmados com tudo, vivíamos intensamente a experiência da Amazônia.

E começamos a trabalhar com a madeira e a palha de forma simples e rústica.

Fizemos o então “Restaurante Chapéu de Palha”. Construído em fins de 1967, empregamos, em seu sistema estrutural armado em forma de cone, uma árvore característica da região chamada aquariquara, foi recoberto com um tipo de palha (buçu) que resiste até hoje sem ter sido substituído. Na parte inferior foram colocados grandes beirais tipo aba de um grande chapéu, elemento que deu origem ao seu nome.

Convidados pelo então Secretário de Produção em 1969 para projetarmos uma Colônia Agrícola às margens do rio Preto, no quilômetro 78 da estrada Manaus-Itacoatiara, colônia experimental que deveria usar o material e a mão-de-obra local, procuramos através de um dimensionamento compatível aos mesmos dar novas proporções e formas de uso. Na Capela Ecumênica ai situada usamos a madeira aquariquara em sua estrutura, que fazia lembrar uma letra A e recobrimos todo o conjunto de cavaco (lascas de madeira tiradas também no local).

Esta capela foi assim construída no sistema de mutirão e até os móveis que foram por nós desenhados foram construídos com seções de paus roliços.

E, no nosso aprendizado constante, nos maravilhávamos com a habilidade no manejo do machado e da enxó pelo caboclo. E, quando convidados por importante grupo de empresários locais, projetamos e construímos uma loja, na esquina da avenida principal de Manaus, com mais de 50 metros de fachada somente nesta avenida, próxima ao Teatro Amazonas, toda em madeira lavrada com peças de seção de 25x50cm com até 11 metros de comprimento, tendo sido colocado em seu interior um painel fotográfico mostrando como se abatia, preparava e transportava a madeira na floresta. Identificamos cada tronco com o seu nome regional e o seu nome científico, fornecido pelo INPA.

No INPA — Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia —, fomos responsáveis por sua implantação e o projeto de todas as suas unidades iniciais (mais de 20 prédios).

Eram unidades administrativas, laboratórios, alojamentos, residências, caixa d’água elevada, garagens, etc. Procuramos um sistema bastante simples, modulado, com beirais bastante amplos e todos os blocos orientados de acordo com as necessidades da região.

A implantação procurava preservar ao máximo a vegetação nativa tipo capoeira e os caminhos internos circulavam de maneira pouco rígida.

Os princípios de ventilação da cobertura e dos cômodos foram aplicados permitindo resultados bastante agradáveis do ponto de vista de conforto e de aparência externa.

Próximo ao INPA e separado por uma avenida encontra-se a grande área pertencente à Universidade do Amazonas e onde irá se situar o seu então Campus Universitário, projeto que também foi elaborado pelo nosso escritório.

Mais uma vez a preocupação de integrar as edificações ao sítio foi mantida. Após minucioso levantamento topográfico e pesquisa in loco situa-se o Campus numa elevação praticamente no centro de cerca de 600 hectares, área esta de dimensão bem significativa dentro da cidade de Manaus.

A implantação da edificação deverá verificar-se evitando ao máximo o uso de equipamentos de terraplenagem, com o sacrifício do menor número possível de árvores e acomodando os vários blocos no suave declive do terreno, permitindo dessa maneira uma ventilação em todos os blocos do conjunto.

A solução adotada prevê vários blocos separados por jardins e ligados por passarelas de circulação. Estes blocos serão construídos num sistema de pré-fabricação ou deverá permitir a construção por etapas e inclusive atender à necessidade de ambientes especiais de laboratórios e salas assim com equipamentos sensíveis.

Os jardins internos e a imensa área coberta com “ripados” que fica assim integrada ao Centro Comunitário funcionarão como museu botânico de plantas amazônicas, permitindo aos usuários uma familiarização com as plantas e seus nomes usuais e científicos.

O Campus está projetado de acordo com a nova orientação do sistema universitário, que funciona como um todo, integrando todas as modalidades de técnicos e especialidades que usam os mesmos equipamentos comuns, embora possuam suas áreas específicas de laboratório, salas especiais, etc. Outro detalhe importante é a localização da biblioteca, no centro do conjunto de ensino, que irá permitir uma grande intimidade dos universitários com a mesma e com isto criando o hábito da leitura e pesquisa.

Sendo necessária a mudança de nossa primeira residência, construímos uma segunda também em madeira, porém usando novo dimensionamento e processo construtivo diferente.

Usamos troncos aplicados de forma natural com 50cm de diâmetro, peças de madeira lavradas e no piso do 2º pavimento pranchas de 3 polegadas de espessura.

Vários detalhes e soluções que empregamos nesta casa também iriam funcionar como experiência. Um jardim interno, com a cobertura interrompida em seu trecho, permite, assim juntamente com os elementos vazados e tipo de janelas empregadas, uma ventilação permanente. Os vidros usados foram de cor amarela e com isso reduzimos a luminosidade e o calor em seu interior. A essa se integra a vegetação exterior, em sua maioria seringueiras, numa comunhão fácil e espontânea.

Em algumas outras residências foram aplicados estes elementos e princípios que procuram substituir em alguns trechos os elementos construtivos convencionais tipo janelas e paredes por painéis de elementos vazados que permitem a ventilação farta e permanente.

Também projetamos os reservatórios elevados do então novo sistema de abastecimento de água de Manaus. Nestes projetos procurou-se uma integração dos imensos volumes elevados com o sítio, que necessariamente deveriam localizar-se em pontos urbanos de grande evidência, usando uma solução semelhante para os 5 reservatórios iniciais, de capacidade que variavam de 5.000m3, 3.500m3 e 2.500m3.

Eles se integraram perfeitamente à paisagem urbana sem agredi-la como era esperado.

E como podemos ver não se limitou somente à madeira o nosso trabalho.

Temos na então sede da Zona Franca de Manaus — SUFRAMA, no Distrito Industrial, uma outra edificação, que procura atender às condições do clima e às necessidades do programa. Com a cobertura inteiramente independente das paredes e tetos, e usando módulos de 15x15m de concreto armado, procurou-se, através de uma tiragem de ar na parte superior de cada unidade tipo claraboia, criar condições favoráveis ao clima da região.

Projetamos também a então Central de Abastecimento do Amazonas — CEASA.

Usamos coberturas de chapas metálicas tirando proveito de suas características técnicas de poucos apoios e grandes balanços.

Após esta abordagem ao nosso trabalho, que atinge também a outras áreas como escolas, clubes e centros de esportes, voltaremos ao tema arquitetura de hoje.

Manaus hoje está preocupada com a região. As cópias e as importações de soluções de outras regiões reduziram-se muito. Os beirais já são assim muito empregados.

Ainda que timidamente começa a se criar uma mentalidade relativa às necessidades regionais.

O Instituto Nacional de Pesquina da Amazônia prepara um grande trabalho na área da habitação, a ser desenvolvido em toda a Amazônia durante alguns anos, com o apoio financeiro do então BNH e que deverá ser de grande importância para a arquitetura no futuro.

E dessa maneira teremos condições de sermos coerentes com a época em que vivemos.

Procurando resolver os nossos problemas, identificando-os, analisando-os, com soluções que se adaptem às necessidades, recursos financeiros, usando tecnologia correta e atual.

Não deverá haver preocupações com estilos e sim preocupações em soluções corretas e de emprego correto dos materiais.

Tecnologia avançada e mau uso, ou seu emprego sem justificativa poderão gerar assim monstrengos como os motéis de fiber glass tipo cogumelo instalados pela Petrobrás ao longo de rodovias na Amazônia, que são verdadeiros absurdos terem sido propostos, quanto mais executados.

E o caminho da arquitetura começa a querer se delinear. Nessa fase de desenvolvimento temos um belo exemplo de arquitetura, tecnologia e ecologia, que é o Aeroporto Internacional Eduardo Gomes para aviões supersônicos, projetado pela então firma Hidroservice.

Amplo, de uma técnica aprimorada, causa um agradável impacto a quem chega e sua integração com a região se faz de maneira fácil e agradável, apesar da natureza da edificação.

Em contrapartida possuímos um belo exemplar da fórmula milagrosa, nacional, de soluções de projetos arquitetônicos, o tão famoso e atual estilo “colonial”. Reflete toda pujança da anticriatividade, da não-integração ao momento presente, da eliminação da personalidade regional e do receio da opinião pública na aceitação de novas fórmulas. Refugiam-se no colonial porque ele agrada e porque bem ou mal ele é aceito e querido.

Muitos confundem colonial com o uso da telha de barro tipo colonial. Seu simples emprego dá a sensação das construções da época, em que este era o único tipo de cobertura existente.

A espacificação deste material fará com que sua aparência se assemelhe, sem que seja necessário copiar ou adaptar seus elementos restantes tão sinceros e respeitados nas edificações originais. Vale a pena sair por instantes do tema e de relance pensarmos na mais moderna cidade brasileira. Exemplo de urbanismo atual e que tristemente em torno de um lago se constroem residências “coloniais”.

Sentimos aí que a arquitetura de uma maneira geral está desorientada.

A preocupação maior é de agradar, de apresentar soluções que assombrem, que dêem nome e renome, em vez de um trabalho sério, coerente e integrado. Isto é, a arquitetura, integrada no tempo e no espaço. Ela seria respeitada como todas as que assim procederam e que permanecem vivas e atuais, como a dos egípcios, gregos, romanos.e do nosso colonial.

E em Manaus já temos o colonial do ano de 1976, em forma de hotel, luxuoso, com vegetação, ele impressiona e agrada a quem chega. Porém poderá estar em Foz do Iguaçu, no Brasil Central ou no Nordeste brasileiro, que ele não diz nada em relação à Amazônia. Seu paisagismo não situa o hotel num barranco da Amazônia, fazendo mais parecer que estamos numa ilha muito bem tratada na baía de Guanabara.

Perdemos mais uma oportunidade de mostrarmos a Amazônia e suas riquezas através das seus recursos, desta feita assim aplicados na Arquitetura.

Esta diretriz deve ser uma constante na Arquitetura. Sempre que possível procurar situá-la na região.

E antes de finalizar devemos falar também, embora ligeiramente, na cidade de Manaus e seu desenvolvimento atual.

Se a primeira fase de seu desenvolvimento seria lembrada como um período áureo, em que tudo seria feito com horizontes largos. As diretrizes de desenvolvimento que orientaram e resistiram até os dias de hoje, esta segunda fase se caracteriza justamente pelo inverso.

Preocupa tremendamente a todos o que ocorre em Manaus. O crescimento vertiginoso atingido assim nestes poucos anos superou a todas as expectativas.

A população que em 1967 era de cerca de 260.000 habitantes passou para cerca de 600.000.

Acompanhar este crescimento com todos os problemas dele decorrentes resorve a todos os órgãos do governo. O cotidiano é violento. O que normalmente iria acontecer gradativamente, talvez ao longo de 50 anos, aconteceu em 10. E não estávamos assim preparados.

Hoje o perímetro urbano explodiu e ainda assim estamos envolvidos em resolver os problemas da área central e da sua periferia mais próxima.

Muito da característica inicial da cidade se perdeu dando lugar à Manaus de hoje. Edifícios começam a nontilhar a silhueta urbana, fazendo com que se possa antever em futuro próximo o caos urbano de todas as cidades atuais. Tais edifícios que um dia cresceram diante do orgulho da população, assistia à construção dos edifícios de muitos andares achavam que isto era sinal de cidade grande e progresso.

A comunhão cidade floresta que existia na Manaus de antigamente, isto é, na Manaus de 1967, hoje já se afastou bastante. E o Urbanismo adequado a uma cidade do trópico e da Amazônia? Será que no futuro teremos condições de aí habitarmos sem usarmos aparelhos de ar condicionado em todos os ambientes e automóveis?

Será por acaso que este ano tivemos o verão mais rigoroso de todo o período que moramos em Manaus. Ou será que ele é decorrente do crescimento dos últimos anos. Da implantação dos vários acessos do então Plano de Desenvolvimento Local Integrado e do afastamento do verde compacto da floresta Amazônica?

Estas são as grandes dúvidas. Elas poderão pôr abaixo todo o sentido da Arquitetura que falamos, integrada à região e ao sítio. Falamos de forma mais ampla. Pensamos na Manaus de amanhã, Manaus dos nossos filhos e das gerações futuras. O que estaremos preservando para eles?

Será que não poderíamos deixar como lembrança da época atual outras diretrizes de crescimento que resistissem e orientassem a cidade durante muitos anos?

Este é portanto um momento significativo para todos nós que vivemos neste presente. Rapidamente irá passar, permanecendo somente as consequências boas e más que iremos deixar incorporadas à região e suas cidades.

Fonte: Arquitetura na Amazônia ontem e hoje de Severiano Mário Porto. Anais da Biblioteca Nacional (RJ), p. 217 a 224.

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